segunda-feira, novembro 11, 2013

08 de Novembro - Beata Elizabeth da Trindade

A Conformidade com Cristo

fonte: Doutrina Espiritual - Beata Elisabeth da Trindade


“Que eu seja para Ele uma humanidade de acréscimo.”


Cristo veio restituir à humanidade decaída o esplendor da imagem divina, que o pecado havia feito perder. Alguns reproduzem com brilho especial este ou aquele aspecto da vida de Jesus: seu silêncio, e Nazaré, o poder de suas palavras sobre as multidões, seu domínio das almas, as ignomínias da Paixão, o abandono dos seus, a humildade, a paciência, o desprezo das riquezas, a vida de adoração e reparação, o amor para com o Pai, etc...

“Vivo enim, Jam non ego, vivit vero in me Christus” (Já não sou eu quem que vivo, é Cristo que vive em mim – Gl 2,20): eis aí o meu sonho de Carmelita!”

Esta transformação começada no batismo prossegue sem interrupção através de todas as etapas de sua vida. Mesmo as festas mais mundanas não conseguiam afastá-la da invisível presença de Cristo. No leito das dores, seu único desejo é morrer transformada no Crucificado. As epístolas de São Paulo foram fontes de luz para esta alma. As fórmulas de fé por ele dirigidas aos primeiros cristãos contém, resumidamente, todo o ensino da Igreja sobre o mistério de Cristo.

Nossa predestinação em Jesus Cristo e a restauração Nele de todo o universo, nossa incorporação ao Filho de Deus, cabeça do corpo místico composto de todos os remidos, a necessidade de nos identificarmos com todos os movimentos da sua alma divina, de exprimirmos Jesus Cristo diante do Pai, de ser-lhe de corto modo uma “humanidade de acréscimo” em que possa renovar todo o seu mistério de Cristo Adorador e Salvador foi a riqueza e força de seus escritos espirituais.

1. Nossa predestinação em Cristo

“Porque os que de antemão Ele conheceu, esses também predestinou a serem conformes à imagem de seu Filho. E os que predestinou, também os chamou; e os que chamou, também os justificou; e os que justificou, também os glorificou” (Rm 8, 29-31).

“Os que Ele conheceu. Não somos nós deste número? Sim, nós lhe pertencemos pelo batismo, é o que São Paulo exprime por estas palavras: Chamou-os. Sim, fomos chamados a receber o selo da Santíssima Trindade. Ao mesmo tempo que nos tornamos, segundo a linguagem de São Pedro, ‘participantes da natureza divina’ (2Pd 1,4), recebemos um‘começo de seu ser’ (Hb 3,14). Em seguida, justificou-nos pelos sacramentos, por seus toques diretos no recolhimento profundo de nossa alma; ‘justificados fomos também pela fé’ (Rm 5,1) e segundo a medida de nossa fé na redenção de Jesus Cristo.”

“’Ele decidiu restaurar todas as coisas em Cristo’ (Ef 1,10). Para que eu realize pessoalmente este plano divino, aqui está ainda São Paulo que me vem em ajuda para traçar-me um regulamento de vida: ‘Andai em Jesus Cristo, enraizada Nele, firme na fé, crescendo Nele cada vez mais em ação de graças’ (Cl 2,6-7)”.

É nesse seu aparente comentário das fórmulas paulinas que Ir. Elisabeth revela seu pensamento espiritual mais íntimo. Como verdadeira carmelita, insiste antes de tudo sobre o desapego total, prelúdio da união divina.

“Andar em Cristo: penso que é sair de si, perder-se de vista, deixar-se, para entrar mais profundamente Nele, a cada minuto que passa. Tão profundamente que Nele sejamos enraizados e que, em cada acontecimento, em cada incidente, possamos lançar o belo desafio: ‘Quem me separará do amor de Cristo?’ (Rm 8,35). Quando a alma conseguiu fixar-se Nele tão profundamente, quando suas raízes estão assim Nele mergulhadas, a seiva divina nela circula abundantemente, e tudo o que é vida imperfeita, banal, natural, é destruída. A alma assim despojada de si mesma, revestida de Jesus Cristo, nada mais teme das influências de fora, nem das dificuldades de dentro, porque tudo isso, longe de lhe ser obstáculo, só faz ‘enraizá-la ainda mais profundamente no amor’ (Ef 3,17) do Mestre. E o que significa ser edificado Nele? O Profeta canta também: ‘Ele edificou-me sobre um rochedo, por isso minha cabeça levanta-se acima dos inimigos que me cercam’ (Sl 26,5-6). Não é esta a imagem da alma edificada em Jesus Cristo? Ele é esse Rochedo onde ela é elevada acima de si própria, dos sentidos, da natureza, das consolações e das dores, acima de tudo o que não é exclusivamente Ele. E ali, em plena posse de si, ela se domina, ultrapassa-se a si mesma e a tudo mais.”

“São Paulo recomenda-me ainda ser firme na fé, nessa fé que não permite jamais à alma adormecer, e conserva-a bem atenta, sob o olhar do Mestre, totalmente recolhida sob sua Palavra criadora; nessa fé no ‘Grande Amor’ (Ef 2,4) que permite a Deus, como diz São Paulo, cumular a alma ‘segundo sua plenitude’ (Ef 3,19)”

“Finalmente o Apóstolo deseja que eu ‘cresça em Jesus Cristo pela ação de graças’: é onde tudo deve terminar! ‘Pai, dou-Vos graças!’ (Jo 11,41). Eis o cântico de meu Mestre e Ele quer ouvir-lhe o eco na minha!” UR 33-35

2. A presença íntima de Jesus

Enquanto para a maioria dos cristãos Jesus é um ser histórico, desaparecido do cenário do mundo há vinte séculos, ou uma entidade abstrata retirada nos altos céus, numa eternidade inacessível, para Elisabeth da Trindade, como para todos os santos, Jesus é uma realidade concreta, cotidiana, que anima as menores atividades de sua existência. Sua presença invisível mas próxima segue-os por toda parte. A cada instante sentem-no junto a si, esse Jesus que lhes prodigaliza a graça, ilumina, sustenta, castiga, se necessário, salva e dá vida eterna.

Jesus está presente em toda a parte. Com o Pai e o Espírito, enche o tempo e o espaço. Se Ele se retirasse, toda a criação voltaria ao nada.

Ele é a vida de todos: à multidão dos predestinados, comunica a luz da glória que os beatifica; à Igreja militante, dá-se pela fé e pelos Sacramentos. Temos em Cristo o ser, movimento, a vida e “sem Ele nada podemos fazer” (Jo 15,5).

Nesta doutrina se apoiavam os movimentos interiores de Elisabeth. Gostava de refugiar-se no mais íntimo da alma, sob o impulso da graça deste Cristo que nela vivia. Ela habituara-se a ir a tudo através Dele, suplicando-lhe que a revestisse de sua pureza divina, a virginizasse, elevasse sua alma acima das agitações da terra, a conservasse calma e pacífica como se já estivesse na eternidade.


“Quão suave e doce é esta divina presença do Mestre. Ela fortifica a alma. Pensar que Deus nos ama a ponto de habitar em nós, de fazer-se o companheiro de nosso exílio, o confidente, o amigo de todos os instantes...” C305

Esta união íntima com Jesus presente no fundo da alma tornara-se o ponto de convergência de sua fé, de sua caridade, de sua vida de prece e adoração.

“Permanecei em mim (Jo 15,4). É o Verbo de Deus quem nos dá esta ordem, quem exprime esta vontade. Permanecei em mim, não por alguns instantes, por algumas horas passageiras, mas permanecei de modo permanente, habitual. Permanecei em mim, orai em mim, adorai em mim, amai em mim, sofrei em mim, trabalhai, agi em mim. Permanecei em mim, e então podeis vos apresentar a todos e a tudo”. CF 3


“Que o Pai conceda, segundo as riquezas da sua glória, a graça de que vós sejais fortalecidos em poder pelo seu Espírito no homem interior, que Cristo habite pela fé em vossos corações e que sejais arraigados e fundados no amor. Assim tereis condições para compreender com todos os santos, qual é a largura e o comprimento e a altura e a profundidade, e conhecer o amor de Cristo que excede a todo conhecimento, para que sejais plenificados com toda a plenitude de Deus” (Ef 3, 14.16-19)

“Ele está em nós para santificar-nos. Peçamos-Lhe, pois, seja Ele próprio a nossa santidade. Quando Nosso Senhor estava na terra, diz o Evangelista, ‘uma virtude secreta emanava Dele’(Lc 6,19). O seu contato restituía a saúde aos doentes, a vida aos mortos. Pois bem, Ele está sempre vivo: vivo em seu Sacramento, vivo em nossas almas. Ele o diz: ‘Se alguém me ama, guardará minha palavra e o meu Pai o amará e a ele viremos e nele estabeleceremos morada’ (Jo 14,23). Se Ele está conosco, façamos-Lhe companhia, como um amigo a seu amigo. Esta união divina e toda íntima é como a essência de nossa vida no Carmelo”. C 179

3. Devoção à alma de Cristo

O que há de realmente característico em Elisabeth é sua devoção tão pessoal para com a alma de Cristo. Toda a atividade dos espíritos celestes e dos santos não iguala o menor ato de virtude da alma de Cristo. Na alma de Cristo há abismos de luz, de amor, de beleza divina, cuja contemplação intuitiva será, depois da visão de Deus, nossa maior alegria na eternidade.


4. Identificação com todos os movimentos da alma de Cristo

Elisabeth compreendeu até que ponto Jesus Cristo nos pertence: “Sinto que todos os tesouros contidos na alma de Cristo são meus”.


Tomou como divisa de sua vida religiosa: “Identificar-se com todos os movimentos da alma de Jesus”.

À medida que se desenvolve sua vida espiritual, esta identificação com os sentimentos mais íntimos da alma do Mestre torna-se uma grande realidade. Todo o esforço da sua vida interior consiste em “entrar no movimento de sua alma divina”.

“Ó meu Cristo Amado, Crucificado por amor (...) peço-Vos revestir-me de Vós mesmo, identificar a minha alma com todos os movimentos da vossa, submergir-me, invadir-me, substituir-vos a mim, para que minha vida seja apenas uma irradiação da Vossa”. Elevação à Santíssima Trindade

5. Exprimir Jesus Cristo diante do Pai

Um dos efeitos mais excelentes desta devoção foi identificar Elisabeth com os sentimentos mais íntimos de Jesus para com o Pai. Um duplo movimento espiritual opera-se dia e noite na alma de Jesus Cristo: a redenção do mundo e a glória do Pai. Esta preocupação primordial da glória do Pai aparece com evidência nos menores gestos e feitos da vida de Jesus.

Irmã Elisabeth teve, em grau excepcional, consciência desse lugar primordial da glória do Pai nos sentimentos mais íntimos de Jesus, Daquele que foi o “mais perfeito louvor de glória do Pai”.

“No belo discurso, depois da Ceia, que é como um derradeiro hino de amor de sua alma, o Divino Mestre dirige ao Pai aquela palavra tão bela: ‘Eu te glorifiquei na terra e concluí a obra que me encarregaste de realizar’ (Jo17,4). Penso que cada um de nos devia repetir estas palavras todos os dias, nós que lhe pertencemos, e que, por conseguinte, devemos identificar-nos totalmente com Ele. Dir-me-eis talvez: Mas como glorificá-Lo?... – É muito simples! É Nosso Senhor quem nos revela seu segredo: ‘Meu alimento é fazer a vontade Daquele que me enviou’ (Jo 4,34)”. C264

“Tudo eu considero como perda, pela excelência do conhecimento de Jesus Cristo, meu Senhor. Por seu amor, tudo perdi...e tudo tenho por esterco, para ganhar e Cristo e Nele estar, não com minha própria justiça, mas com a justiça que vem de Deus pela fé. Nada mais quero saber senão conhecê-Lo, comungar em seus sofrimentos, conformar-me com sua morte. Continuo minha carreira, esforçando-me por atingir a meta que Jesus me traçou ao atrair-me a si. Esquecendo-me do que fica para trás e avançando para o que está adiante, corro direto ao alvo, ao prêmio da vocação a que Deus me chamou em Jesus Cristo” (Fl 3, 8-10.12-14)

“Mas como poderemos corresponder à dignidade de tal vocação? Eis o segredo: ‘Para mim o viver é Cristo!... Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim’ (Fl 1,21 e Gl 2,20). É preciso sermos transformados em Jesus Cristo. Tenho, pois, de estudar este divino Modelo a fim de identificar-me tão bem com Ele que o possa exprimir sem cessar aos olhos do Pai. E que diz Ele logo ao entrar neste mundo? ‘Eis que venho, ó Deus, para fazer a vossa vontade’(Hb 10,9). Parece-me que esta deveria ser a batida do nosso coração: Eis-nos, ó Pai, para fazer vossa vontade.”

“Quando chegar a hora da humilhação, do aniquilamento, lembrar-se-á daquela palavra: ‘Mas Jesus se calava’, e se calará também, guardando toda a sua força no Senhor, esta força que só se pode haurir no silêncio. No momento do abandono, da desolação, da angústia – que arrancaram a Cristo o grande grito: ‘Por que me abandonaste?’ (Mt 27,46) – ela se recordará da oração do Mestre: ‘Que eles tenham em si minha plena alegria’ (Jo 17,13). E bebendo até a última gota o cálice preparado pelo Pai, saberá encontrar em seu amargor uma suavidade divina.” UR 36-39

“A alegria de minha alma – quanto à vontade e não quanto à sensibilidade – consiste em tudo o que possa imolar-me, destruir-me, rebaixar-me, porque quero dar lugar a meu Mestre: ‘Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim’ (Gl 2,20). Não quero mais viver de minha própria vida, mas ser transformada em Jesus Cristo, a fim de que minha vida seja mais divina que humana e que o Pai, ao inclinar-se sobre mim, possa reconhecer a imagem do Filho amado, no qual pôs as suas complacências”. CF 12

6. Humanidade de Acréscimo

Um segundo movimento animava, dia e noite, a alma de Jesus: o desejo de nossa redenção. Jesus, sempre em solidão com o Pai, tratava dos negócios da nossa salvação. Não nos perdeu de vista sequer um momento, seguindo-nos sempre com o seu olhar de Cristo que tudo vê: o céu, o inferno, os destinos da Igreja, os interesses das almas, mesmo nos mais insignificantes detalhes. Nada Lhe ficou oculto do passado, do presente e do futuro. Esta ciência de Jesus visava a nossa salvação.


“Sejamos-Lhe de certo modo uma humanidade de acréscimo, na qual possa renovar todo o seu mistério. Supliquei-lhe vir a mim como Adorador, como Reparador e como Salvador. Impossível dizer-vos a paz de minha alma ao pensar que Ele supre todas as minhas impotências e que, se caio a cada instante, Ele está perto de mim para erguer-me...” C 214

“Que necessidade sentimos de nos santificarmos, de nos esquecermos para servir exclusivamente aos interesses da Igreja. Como é sublime a missão da Carmelita! Deve ser medianeira com Jesus Cristo, ser para Ele uma humanidade de acréscimo, na qual Ele possa perpetuar sua vida de reparação, de sacrifício, de louvor e de adoração”. C 256

“Quem vive na caridade participa de todo o bem que se opera no mundo”. São Tomás de Aquino

A ambição de Ir. Elisabeth era “dizer a todas as almas” o segredo de felicidade e de santidade oculto no íntimo delas pelo mistério da inabitação divina

Uma verdadeira Carmelita ocupa-se o dia todo em salvar as almas pela oração e pela imolação silenciosa; e quando, à noite, chega a hora do repouso indispensável, antes de adormecer refugia-se sob a todo-poderosa intercessão universal da Virgem Co-redentora, suplicando-lhe que, durante o sono, continue por ela a obra de mediação em prol dos pobres, pecadores e prossiga eficazmente a destruição do mal no mundo.

Assim fazia Elisabeth, esquecendo a própria dor e ultrapassando-se a si mesma, com o único desejo de “gastar-se” por amor, de “destilar seu sangue gota a gota” em “favor do Corpo Místico de Cristo, que é a Igreja” (Cl 1,24). Ela chamava isto: “Ser para Ele uma humanidade de acréscimo”.

7. Conformidade com a morte de Cristo

Ser um outro Cristo, mas sobre a Cruz. Tal foi o desejo supremo de Elisabeth.

“Configuratur morti ejus (Conformando-me com Ele na sua morte: Fl 3,10), eis o que me dá vida e forças no meio do sofrimento. Se soubésseis a obra de destruição que experimento em todo o meu ser: é o caminho do Calvário que se abriu, e sinto-me feliz em seguir por ele como esposa ao lado do Divino Crucificado”. C 294

Como todos os santos, Elisabeth conhecia o valor do sofrimento e sabia que a união divina só se consuma na cruz. “O sofrimento é coisa tão grande, tão divina! Parece-me que, se no Céu, os bem-aventurados pudessem ambicionar alguma coisa seria este tesouro. Que alavanca poderosa sobre o coração de Deus. Além disso, não achais que é tão bom oferecer algo a quem se ama?”. C 207

Não é que a dor a deixasse insensível, mas sabia tirar a força de sofrer da lembrança do Mestre Crucificado. É ela quem nos revela o seu segredo:

“Vou dizer-vos como faço quando sinto cansaço: fito o Crucificado! Quando vejo como se entregou à morte por mim, parece-me que o mínimo que posso fazer é gastar-me em troca do muito que me deu. Se formos fiéis em viver de sua vida, se identificarmo-nos com muita simplicidade a todos os movimentos da alma do Crucificado, já não teremos de recear nossas fraquezas porque Ele será a nossa força.” C 156

“Saboreio, experimento alegrias desconhecidas: a alegria da dor! Antes de morrer, desejo ser transformada em Jesus Crucificado”. C 324

Desde quando escolheu a Cristo, fez suas todas as escolhas de Cristo e, querendo conforma-se totalmente à sua vida e participar de sua missão, desejou com ardor não só levar a cruz que Ele levou, mas também ser preço de resgate junto com ele e por meio Dele. “Ser conforme à imagem do Crucificado”.

“Quando se quer ter em si o Corpo de Jesus, é preciso aceitar também a cruz, a coroa de espinhos. Deus não pode doar-se sem elas. Oh! Jesus! Vinde com sua Cruz!” D 65

Compreender o valor redentor do sofrimento, em união com aquele de Cristo, é conhecimento que prolonga no mundo o mistério do sofrimento do Filho de Deus para salvar as almas, que foi a sua Paixão, o intento de sua Encarnação, e a razão última de todas as suas humilhações. Quando se ama a Deus, a sede de almas é a conseqüência necessária de tal amor. Elisabeth a experimentou plenamente; aprendeu que o verdadeiro amor não se nutre de suspiros e desejos, mas se demonstra de modo concreto na oferta do próprio ser como vítima de expiação. “As cruzes não amedontram as filhas de Santa Teresa”.

Para sua mãe, cujo coração se dilacerava ao pensar que ia perdê-la, dirige algumas palavras de consolo para lembra-lhe o sentido de seu sofrimento redentor:

“É Deus quem se compraz em imolar sua pequena hóstia, mas esta missa que Ele celebra comigo e em que o sacerdote é o seu Amor pode durar ainda muito tempo. A pequena vítima não acha o tempo longo nas mãos daquele que a sacrifica. Ela pode afirmar que se passa pela trilha do sofrimento, palmilha mais ainda a estrada da felicidade, da verdadeira felicidade, daquela que ninguém pode roubar-lhe.”


“’Alegro-me, dizia São Paulo, em completar em minha carne o que falta à paixão de Cristo pelo seu Corpo, que é a Igreja’ (Cl 1,24). Quanto deveria exultar divinamente o teu coração de mãe, ao pensar que o divino Mestre se dignou escolher tua filha, o fruto de tuas entranhas, para associá-la à grande obra de redenção e para sofrer nela como uma extensão de sua própria paixão. A esposa pertence ao esposo, e o meu tomou posse de mim; quer que seja para Ele uma humanidade de acréscimo em que possa sofrer ainda pela glória do Pai, para servir às necessidades da Igreja”. C 309 


“Alegra-te com o pensamento de que, de toda a eternidade, o Pai nos conhece, como diz São Paulo, e quer ver em nós a imagem de Seu Filho Crucificado. Ah! Se soubesses quanto o sofrimento é necessário para a realização da obra de Deus na alma!... Deus tem um imenso desejo de enriquecer-nos com suas graças, mas a medida desses graças depende da proporção em que nos deixamos imolar por ele, imolar na alegria, na ação de graças, a exemplo do Mestre, repetindo com Ele: ‘Deixarei eu de beber o cálice que o Pai de deu?’ (Jo 12,27). O Divino Mestre chamava a hora da Paixão sua hora (Jo 12,27), aquela para a qual viera e pela qual ardentemente aspirava. Quando a nós se apresenta um grande ou um pequenino sacrifício, pensemos logo que é a nossa hora, o momento em que vamos provar nosso amor para com Aquele que nos ‘amou até o excesso’, diz São Paulo (Ef 2,4)”. C 308

Para Elisabeth, o sofrimento é também um sacramento que virginiza a alma e a torna acolhedora para viver todo o tempo em companhia de Jesus. Além disso, o sacrifício deve ser considerado e então recebido como uma prova de amor do Bom Deus; ele configura a Seu Filho e aproxima sempre mais Dele. Pode-se dizer, então, que a Cruz é justamente o “selo dos predestinados”. Todas as vezes que a abraçamos com amor, escolhemos o caminho da santidade. Condividí-la com Jesus é viver antecipadamente o Paraíso. Amar a Cruz, para Elisabeth, é encontrar, tanto quanto possível, a felicidade sobre a terra.

“Confesso que sinto uma alegria íntima e profunda ao pensar que Deus me escolheu para associar-me à Paixão de seu Cristo, e este caminho do Calvário que devo subir a cada dia, parece-me mais o caminho da bem-aventurança.” C268

O Senhor considera a boa vontade das almas, e quando as percebe sinceramente animadas pelo desejo de identificarem-se com Seu Filho Bendito, não se deixa esperar. Elisabeth era jovem, forte, robusta; ninguém duvidava de sua saúde. Não passava pela cabeça de ninguém que aquela jovem vida, por um desígnio imperscrutável de Deus, chegaria tão depressa à perfeição da caridade.

Sempre muito reservada, Elisabeth era quase incapaz de se queixar, pois o sofrimento lhe oferecia a ambicionada ocasião de se assemelhar sempre mais ao seu Mestre. Suportava as dores que lhe afligiam com a paciência e a resignação dos santos, porque via no sofrimento um gesto concreto do amor de Jesus. Ainda que lhe fosse permitido algum alívio de tempos em tempos, jamais haveria de renunciar à sua cruz, que abraçava com os mesmos sentimentos de seu amado.

Seu derradeiro canto é, assim, um hino ao sofrimento: o verdadeiro “louvor de glória” é uma alma crucificada.


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